Os transtornos de Phelps. O homem das manchas
Ele caiu na água para a mãe ter certeza de que ele saberia se salvar em caso de afogamento. Ele também caiu na água para tratar o transtorno de déficit de atenção com hiperatividade. O TDAH, diagnosticado quando tinha 9 anos. Ele não ia bem na escola por não conseguir se concentrar por conta dessa condição. Ele precisava de foco. E de um ambiente onde as longas orelhas não ouvissem o bullying pelo tamanho delas. Além do boné enfiado na cabeça para disfarçar, ele conseguia afogar as mágoas mergulhando na piscina. Ainda que até os 7 anos odiasse água na cara. Por isso começou a nadar de costas. Até se acostumar a se ver melhor dentro que fora d’água. Onde mais fundo nadava para esquecer os problemas que também teve com o pai que se separou da mãe antes dos 10 anos.
Ele nadaria mais forte para provar a ele o que a relação com o pai privava.
Ele foi duas vezes o terceiro colocado em uma Olimpíada. Duas vezes seria o segundo. No Rio, bateu as mais longas mãos (dos mais longos braços que eram ridicularizados quando criança) três vezes na frente dos outros rivais. Em dois revezamentos, e um nado ele contra ele mesmo, esse cara foi Phelps.
Primeiro. Pela vigésima-primeira vez olímpica.
São 21 ouros em cinco jogos. O Brasil inteiro tem 22 desde a nossa primeira disputa.
Não houve atleta como ele desde 1896. E contando para nossos netos.
O campeão que se aposentou depois de Londres, em 2012. O adulto que resolveu curtir adolescência que não pôde ter por ser atleta. O viciado vigiado 24 horas. O motorista embriagado que foi detido em 2014. O homem que cogitou se matar depois de pendurar a sunga. O ser humano doente que por mais de dois meses procurou ajuda médica para se reencontrar. O filho que reatou relacionamento com o pai logo depois. O noivo que enfim casou com a mulher da vida. O pai do filho que nasceu três meses antes do Rio. O nadador que surpreendeu o próprio treinador com mais conquistas. O maior campeão olímpico que chorou como calouro em cada bandeira do país erguida por causa desse cara que não suportou não fazer nada além de nadar. O homem de tantas manchas como as que carrega no corpo marcado pelo cupping, um tipo de fisioterapia
Não sei como será Michael na aposentadoria definitiva. Ainda que saibamos mais que a professora de inglês do ensino básico, em Baltimore. A que disse a ele e à mãe que Michael jamais chegaria a lugar algum pela falta de concentração e comprometimento (originadas pelo TDAH).
menino inquieto que “não iria longe na vida” é o símbolo de que é possível vencer o bullying, os transtornos e as adversidades fazendo o que ele gosta.
Nada.
Fonte: Blog do Mauro Beting